quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Direita conservadora avança nos EUA: Intolerância e Xenofobia


por Diney Lenon de Paulo


Introdução

O atentado ocorrido no último dia 8 em Tucson, Arizona chamou a atenção do mundo para o que vem ocorrendo na política dos EUA durante os últimos anos. Vítimas de um jovem de 22 anos, Jared Lee Loughner, dezenas de pessoas foram alvejadas com tiros durante um ato político liderado pela congressista democrata Gabrielle Giffords, que se encontra hospitalizada, enquanto 6 outras pessoas morreram.
Esse trágico episódio tem um significado maior do que a grande mídia tem tentado passar ao se referir superficialmente sobre o jovem terrorista, faltando esta pouco para caracterizá-lo como um novo Marc Chapman, assassino do beatle rebelde John Lennon. Não se trata de um ato isolado de um jovem desequilibrado que teve acesso à arma dentro das formalidades legais daquele país, mas sim do reflexo de um movimento político que cresce a cada dia e tem ligações intrínsecas com a política de Obama, com suas promessas de campanha não cumpridas e com a habilidade de setores conservadores e absorver o capital político de um sentimento de descontentamento geral que se alastra nas terras do Tio Sam.
Para se compreender então o que se passa nos EUA e que acabou por contribuir para a execução do atentado terrorista do Arizona é necessário voltar a 2008, ano de eleição do primeiro presidente negro da história dos Estados Unidos da América. Essa eleição representou uma vitória dos democratas carregada de simbolismo e de expectativas de mudanças. É necessário compreender essencialmente o contexto histórico, político e econômico que possibilitou a vitória da pretensa “mudança” que não se realizou, frustrando enorme parcela da população, em especial jovens e latinoamericanos.
Nesse sentido, todo o desenrolar da política estadunidense nesses últimos anos, com o surgimento de movimentos ultra-conservadores e a perda de prestígio e poder no Congresso por parte dos democratas no final de 2010 e a ação de Jared Lee Loughner estão interligados, sendo partes de um mesmo processo.

Sim, nós podemos! 


Yes we can!

Novembro de 2008, um homem de origem muçulmana, filho de um queniano se elege presidente da maior potência econômica e militar da história da humanidade num momento de crise econômica. Barack Hussein Obama assume em meio às expectativas que sua campanha havia lançado, prometendo uma política externa diferente de seu antecessor, o republicano George W. Bush, com a retirada das tropas do Iraque e do Afeganistão e também uma política interna menos rígida para com os imigrantes, defendendo a pesquisa com células tronco, o aborto e a reforma do sistema de saúde com vistas a torna-lo acessível aos mais de 30 milhões de estadunidenses desprovidos desse direito.
Com maioria na Câmara dos Representantes e no Senado tem o poder de implementar seu projeto, contudo, diante de uma crise resultante da especulação imobiliária que afetou todo o sistema financeiro passou a enfrentar a maior crise do país desde a depressão de 1929. Com altas taxas de desemprego e queda de consumo adota medidas que acabam por desagradar a maioria da população, como o Plano de Resgate Econômico (um pacote de U$ 800 bi a banqueiros); Lei de Reinvestimento dos Estados Unidos de 2009 (uma lei que possibilita o Estado a investir em setores da economia, contrariando princípios liberais). Obama também não cumpre sua promessa de retirar as tropas do Iraque e Afeganistão atendendo ao lobby dos maiores contribuintes financeiros das eleições estadunidenses, os intocáveis e respeitados integrantes da indústria bélica.
Diante da recessão, desemprego e descontentamento os republicanos avançam com seu discurso oposicionista e figuras de destaque ganham espaço na grande imprensa ianque, como a ex-candidata a vice-presidente de John MacCain, Sarah Palin. Com grande espaço no canal Fox News, de alcance nacional, de propriedade da família Bush, Palin passa a liderar um movimento conservador que vai além do Partido Republicano, que defende valores semelhantes ao fascismo. Desgostosos com as promessas não cumpridas do presidente Obama, muitos estadunidenses aderem a este movimento, que hoje conta com a simpatia de pelo menos 30% da população daquele país, segundo pesquisas recentes.

Sarah Palin


De ex-Missa Alaska a líder do Partido do Chá

Desde a eleição de 2008 Palin já despontava como grande figura conservadora do Partido Republicano. Ex-governadora do inexpressivo estado do Alaska, a ex-Miss daquele estado marcava presença no cenário político com seus discursos incisivos fazendo com que o próprio candidato a presidente derrotado MacCain lhe tecesse elogios: “ela é uma nova e impressionante voz do nosso partido para as reformas e os princípios que sempre foram nossa maior força. Todos acompanharemos ansiosos e com grande interesse o seu futuro serviço ao Alaska, ao Partido Republicano e ao nosso país”.
Com amplo espaço nos grandes meios de comunicação, Palin lança dois livros que figuraram entre os mais vendidos, Going Rogue: Na American Life (Rebelando-se: uma vida estadunidense), um autobiografia que vendeu 2 milhões de cópias e America by Heart: Reflections on Family, Faith and Flag (América de cor: reflexões sobre família, fé e bandeira). Palin consegue grande projeção em todo o país e passa a difundir idéias ultra-direitistas, criticando as ações do governo Obama, principalmente as que vão de encontro aos valores conservadores da sociedade americana, chegando a classificar o Presidente como “um homem fraco”.
Inspirado no precursor da independência americana, o movimento de colonos do século XVIII contra o monopólio da Companhia das Índias Ocidentais sobre o comércio do chá ocorrido em Boston, o Tea Party, ou Partido do Chá surge nesse contexto como movimento ultra-conservador. Palin se coloca como grande líder do movimento, que em 2009 gera vários protestos por todo o país. As principais críticas do movimento se concentram em questões econômicas, principalmente contra o déficit fiscal, que fechou 2010 em aproximadamente U$ 1,5 bi e somado à dívida pública se aproxima à cifra de U$ 14 bi.
Junto à crítica econômica o Tea Party faz oposição à proposta de reforma do sistema de saúde proposta por Obama e considera inaceitável qualquer proposta de controle da poluição industrial e também se opõe à proposta de se estabelecer julgamentos a “terroristas” nos mesmos moldes jurídicos a “cidadãos comuns”. No âmbito da moral, o Tea Party se opõe firmemente ao aborto, ao casamento homossexual, aos imigrantes e à pesquisa com células tronco. O “Partido do Chá” se configura como um movimento forte e crescente que tenta levar o partido republicano e a sociedade americana como um todo mais para a direita e a ineficácia e descumprimento das promessas de Obama só contribuem para esse objetivo.

Obama: de uma grande promessa para uma enorme decepção


Obama perde força no Congresso.

Na história política dos Estados Unidos nunca um Presidente, ou partido governante perdeu tanto poder nas eleições parlamentares como nas ocorridas em novembro passado. Os Democratas que somavam maioria na Câmara dos Representantes agora contam com 193 congressistas e os Republicanos têm a vantagem de contarem com 242 cadeiras. No Senado ainda há maioria democrata, contudo bem menor, 4 senadores a mais, sendo 51 a 47 a configuração atual.
Um dos fatores que contribuiu para a vitória republicana, segundo analistas políticos especialistas no assunto se deve ao fato da grande abstenção de jovens e latinoamericanos que em 2008 foram decisivos na vitória de Obama. O Presidente democrata não conseguiu aprovar sua lei que visava abrir as portas para a legalização da situação de milhões de imigrantes e isso está associado ao forte desemprego gerado pela crise econômica que também fortaleceu o discurso xenofóbico dos republicanos e do Tea Party, que apoiou, através de Sarah Pelin 31 candidatos republicanos e elegeu 20 destes.

Xenofobia e intolerância crescem nos EUA


Um país dividido entre conservadores e ultra-conservadores

Não é por acaso que o atentado terrorista ocorrido no último dia 8 se deu no estado do Arizona. Este estado tem sido um dos líderes do movimento Tea Party. Um exemplo de sua guinada ultra-conservadora é a Lei Anti-Imigrante, que reprime imigrantes ilegais e que tem causado protestos de militantes dos direitos humanos ao mesmo tempo que tem tido apoio de muitos americanos amedrontados com o fantasma já constante do desemprego.
A morte da deputada Gabrielle Giffords e do Juiz federal John Roll são reflexos desse contexto político de recessão não meramente econômica, mas política dos EUA. Roll era um juiz federal indicado, paradoxalmente, por John Maccain, mas era considerado um jurista “aberto” e muito liberal para as linhas conservadoras do Tea Party. O que se tem claro dessa tragédia é que o mal pode ser ainda maior diante do avanço desse movimento ultra-direitista, podendo levar não só republicanos para uma posição mais conservadora, mas todo o sistema político.
A forma como Jared Lee Loughner se portou diante de um Tribunal Federal, logo após o atentado, firme, convicto da “justiça de seu ato” é sinal de que não se trata de um “psicótico” nos moldes hollywoodanos  e sim de um jovem ideologicamente comprometido com os valores da intolerância. Quando do seu discurso de condolências às vítimas do atentado, Obama foi claro ao pedir “união” aos americanos, pois bem sabe que o que está se desenvolvendo em seu país é um movimento que pode se projetar como um novo fascismo.

O Tea Party tem conquistado parcela da amedrontada classe média americana

Não Pise em mim!

Resta aos sobreviventes da ditadura estadunidense buscar furar o bloqueio ideológico a forjar um movimento contra-ideológico para resguardar os valores humanos da própria diversidade humana. Criticar a crise, buscando a sua raiz também é essencial para que o país de maior projeção e poder político mundial não entre numa trajetória ainda mais conservadora, que poderá irá refletir no maior belicismo e imperialismo diante dos povos do mundo.
Sarah Pelin, que após o atentado retirou de sua página na internet a foto de democratas que apoiavam a reforma do sistema de saúde, inclusive de Gabrielle Giffords, sob a mira de uma arma, ao que tudo indica seguirá liderando o movimento conservador rumo às eleições de 2012 com amplo apoio da imprensa conservadora americana. Do seu nacional-populismo conservador não se pode negar, é sedutor e poderá ainda envolver grande parcela da população, o que representa perigo para já famigerada democracia ianque.
Obama, que ainda possui a maioria no Senado e o poder de veto se encontra numa encruzilhada, pois pode ainda buscar apoio para implementar seus alardeados projetos e propostas de campanha, dentre os quais a polêmica reforma do sistema de saúde. Para tanto, deverá fazer um “malabarismo político” para “conquistar” muitos congressistas, inclusive os que receberam U$ 68 mi em suas campanhas eleitorias de empresas de plano de saúde contrárias ao projeto.
Infelizmente, ao que tudo indica, o presidente que vendeu o sonho possível deverá se manter como refém de um conservadorismo republicano e das amarras institucionais, abrindo ainda mais o caminho para novos atos de intolerância como do do Arizona. E o que se pode vislumbrar do movimento do partido do chá são novos Jared Lee Loughner que estão a caminho, esbravejando: dont tread on me!



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