domingo, 28 de março de 2010

MLST e a afronta à ordem. Sobre os Sem Terra, o Congresso e a nossa "esquerda".


O Movimento de Libertação dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, MLST é um movimento pequeno, mas com muita força. Criado a partir de uma dissidência de integrantes do MST, na década de 1990, atua essencialmente nos estados de Pernambuco, Minas Gerais e São Paulo.

Há no país hoje, segundo o pesquisador Bernardo Mançano, 73 organizações de trabalhadores rurais. E o MLST é uma delas. O histórico de atuação do movimento é de ações pacíficas. Quem conhece a realidade no campo sabe que os movimentos não provocam a violência (ou na maioria absoluta das vezes), apesar de viverem constantemente sob o signo de vítimas dela.
A ação do dia 6 de junho é mais uma ação moldada pela grande mídia, os grandes meios de comunicação reacionários que forjam nas consciências uma idéia contrária à ação do povo do MLST têm seus objetivos ao atacar qualquer movimento do povo organizado. Era de se esperar e sempre o será, enquanto vivermos a vergonha da “desumanização” dessas pessoas frente ao luxo de uma minoria de privilegiados, muitos membros de quadrilhas organizadas (a maior delas é a que esteve acuada nesse dia, a quadrilha do congresso). Do conforto dos lares, a classe média condena os atos de “violência” dos que a mídia conseguiu convencionar, classificar como “baderneiros” (hoje, qualquer ação que atente contra ordem é classificada como “baderna”). O povão, entorpecido, se divide, uns condenam a violência, outros com um certo ar “anárquico” se deliciam de ver o pau comendo! Mas o triste é ver nossos “camaradas” do congresso revelando sua posição reacionária diante da ameaça à ordem.
A mídia capitalista se delicia e faz seu papel, joga a sociedade contra o movimento. Os tucanos atacam o governo e dizem que isso é coisa do PT, os latifundiários do PFL pedem exército, manutenção da ordem, a ordem capitalista, mas o que decepciona, deixa triste realmente, é ver o “camarada” Aldo Rebelo condenar o “vandalismo”, termo muito usado pelas forças e mídias reacionárias! A verdade é que, nenhum camarada congressista levantou defesa, ou mesmo, justificação da ação do povo do MLST, pelo contrário, o Partido Comunista do Brasil, PCdoB, partido governista, ainda publicou uma nota condenando a ação dos trabalhadores.
Este artigo está sendo escrito num momento de fortes reflexões sobre o papel que um partido político declaradamente marxista deve ter na nossa sociedade. Vendo a ação dos quase 500 trabalhadores do movimento, que ao serem barrados pela segurança do congresso resolveram exercer o seu direito de entrar na “casa do povo”, como afirmou Rebelo, foram presos e mais uma vez, se criminalizou o movimento social. A pauta do movimento era extensa, tinham uma carta a ser entregue aos deputados, entre as reivindicações o fim da lei que impede a reforma agrária em terras ocupadas. Mas como sabemos, o congresso é um lugar “íntegro”, de justiça, de aplicação das leis e deve manter a ordem!
Que ordem? Que ordem foi rompida? Qual a dimensão da violência dos militantes (diante de uma ação violenta da segurança que tentava impedir o acesso destes “cidadãos”) e a dimensão da violência que sofrem no cotidiano? Pensemos um pouco.
Fazendeiros com dívidas milionárias para com o povo brasileiro, haja vista que devem essa fortuna ao Banco do Brasil fazem manifestações, usam maquinários e fecham estradas exigindo o perdão de dívidas, a renegociação, são atendidos no congresso, pois são financiadores, “companheiros de classe” de muitos congressistas. Usas reivindicação são ouvidas, pensadas, e são muitas vezes, na maioria das vezes, atendidas. O tratamento da segurança para com esses manifestantes é de “senhor, por favor...”. O tratamento da mídia é diferenciado, muito claro sua posição de compromisso com o latifúndio e com a ordem capitalista.
Integrantes de um movimento social, que radicalizam, são baderneiros, condenados pela mídia, pelos direitistas e agora, pela esquerda: “Calma companheiros, não é bem assim”, ou, com todas as palavras do Presidente da “Casa do Povo”:

“O Partido Comunista do Brasil, que apóia e sempre apoiou a luta dos trabalhadores rurais por suas justas bandeiras, vem a público repudiar os atos de violência e vandalismo perpetrados, na tarde de hoje, na Câmara dos Deputados. Atos dessa natureza --inconseqüentes e irresponsáveis-- se voltam contra o próprio interesse dos trabalhadores e de seus movimentos. Ao mesmo tempo, o PCdoB apresenta sua solidariedade e respaldo ao presidente da Câmara dos Deputados, Aldo Rebelo, por suas ações em defesa do Poder Legislativo.”

Eis a questão: O que é o Poder Legislativo? A serviço de quem ele trabalha? Ele foi atacado por quem? Pensando nas classes socais, digo: A defesa do Congresso seria uma atitude benéfica para qual classe? O “ataque” ao Congresso é benéfico para qual classe? Pensemos...
O que incomoda é o termo vandalismo na nota de um partido, dito, marxista-leninista. Procuro entender a tal “estratégia eleitoral”, a “correlação de forças desfavorável”, a necessidade de se ocupar o estado. Procuro fazer a crítica, processa-la, mas não consigo me desatrelar da concepção marxista de que o comunista é comunista em todas ações e declarações, deve ser claro, não mentir para o povo, não subestimar o conhecimento do povo, não negar seu objetivo maior, a derrubada violenta da sociedade capitalista. Me dói ouvir um comunista dizer isso, classificar uma ação de um movimento social, mesmo que espontânea (o que pessoalmente não acredito), como ato de “vandalismo”, com a mesma conotação dada por Antônio Carlos Magalhães, por exemplo.
Nessa reflexão sobre o MLST, que já é antiga sobre os movimentos sociais e sua atuação política, há também uma intenção clara de se pensar os partidos de esquerda do país. Ter de publicar uma nota como essa é, digamos, “o preço que se paga” por aderir ao sistema eleitoral burguês e ter como prioridade de ação política a manutenção no poder, levando a declarações e ações, no mínimo, reacionárias.
O movimento, que em abril do ano passado ocupou o Ministério da Fazenda, busca sim visibilidade e não pode ser condenado por isso. O movimento composto por trabalhadores rurais não pode ser criminalizado. Um comunista não pode fazer uma leitura simples, sem considerar a estrutura social, sem fazer a devida crítica. Quiçá houvesse outra manifestação hoje, uma no Rio Grande do Sul, onde o governo gaúcho tem dado amplo apoio à monocultura do eucalipto, ao deserto verde, outra manifestação na sede do governo de São Paulo, que não avança nas regiões do Pontal do Paranapenema.
Quiçá houvesse mais manifestações, ocupações, mais confronto com a ordem estabelecida! Assim estaríamos avançados no movimento comunista, mas um comunista não pode esconder seus objetivos. Aprendi pela dor, na vida política, que ou se é santa, ou se é puta, pois não dá para acender uma vela ao santo e outra ao diabo. Todo apoio ao MLST, todo apoio ao povo do MLST, ao povo do campo, às dezenas de organizações camponesas dessa América! Venceremos! Para encerrar, citarei um pensamento, uma “máxima” do marxismo, nas palavras do próprio:

“Os comunistas recusam-se a ocultar suas opiniões e suas intenções. Declaram abertamente que seus objetivos só podem ser alcançados com a derrubada violenta de toda ordem social existente.”
Violência, isso, violência, aquilo... Democracia não se faz assim.... Tem de ser dentro da lei... blá...blá...blá... Chega!! Chega de hipocrisia! Chega de atacar os pobres quando estes se levantam. Devem reagir com violência sim, reagir à violência cotidiana, a falta de direitos!! A classe média critica aqueles que comentem ações “não-civilizadas”, mas que santa hipocrisia, criticar a cidadania daqueles que não têm direitos! A ação do MLST é, em verdade, uma reação à condição que vivem milhões de brasileiros sem terra, que são tratados como criminosos por serem corajosos e desafiarem a ordem! Ordem da exclusão!

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